Tive a oportunidade de admirar o espaço do Anexo Original depois de ter sido o edifício complementar do DETRAN e antes de passar pela reforma que o transformou no que é hoje. A experiência poderia ser resumida em apenas uma frase: era o espaço mais perfeito para exposições de arte contemporânea no Brasil. Admirar os dois “pavimentos” (o térreo e o mezanino) e a coleção de pilotis – tudo inundado pela luz brilhante de uma manhã de primavera em São Paulo –, me fez confirmar o que foi um dia o talento de Oscar Niemeyer.
Um espaço arquitetônico ao mesmo tempo forte e sutil, banhado pela luz deslumbrante a ser destinado à arte contemporânea. (E foi nesse momento que me ocorreu convidar Carlito Carvalhosa a ocupá-lo. À época – maio de 2010 –, a produção do artista como que pedia um espaço monumental para se expandir como merecido). Porém, aquela feliz experiência com a obra do arquiteto foi logo interrompida pela informação de que o local mudaria bastante: um sistema de ar condicionado e paredes de drywall já haviam sido adquiridos para aquele espaço e seriam instalados de imediato.
Frente ao irreversível, adivinhei no que se transformaria aquele local, em que arquitetura e luz então se equilibravam com maestria: um imenso “cubo branco” , um portentoso templo de arte, apartado da natureza e da história.
Dito e feito: como todo espaço tradicional de arte moderna, por meio da adaptação pensada para uma arte confinada às suas especificidades preditas, a nova configuração do Anexo Original da nova sede do MAC USP acabou por transformar o edifício tão singular em mais um espaço para a arte tradicional. Ainda um belo espaço – não restam dúvidas – mas fechado em si mesmo, alheio às conexões que seu inventor havia concebido.
Felizmente, porém, Carvalhosa manteve o aceite do convite para a primeira intervenção artística no espaço, mesmo depois da reforma concluída. Felizmente porque o artista, com Sala de Espera, resgata o edifício do destino que, na última reforma, lhe fora traçado: transformá-lo no maior cubo branco brasileiro.
A estratégia de Carlito Carvalhosa para ativar o espaço que lhe foi oferecido, consistiu em tomar como ponto de partida, justamente, o caráter atemporal, “entre parêntesis”, que o Anexo Original assumiu após a última reforma. Para tanto, atacou o principal elemento estrutural da edificação: o conjunto harmonioso de pilotis. A essa quase etérea colunata, que parece emanar como sutil relevo do espaço todo branco, Carvalhosa opôs quase uma centena de antigos postes de madeira, que um dia serviram à rede elétrica.
Vista a intervenção do alto (a partir do mezanino), ou mesmo ao experimentá-la já em seu interior, o visitante perceberá que o artista confere àquele espaço – antes quase sagrado –, uma dimensão irreversível de atualidade. É justamente no jogo entre a série de pilotis e os postes nunca na vertical (todos se posicionam entre o horizontal e o oblíquo), aliado à densidade matérica, à espessura histórica dos postes, que a intervenção de Carvalhosa evidencia sua razão de ser.
O espaço que havia se tornado recluso, fechado em si mesmo, quase uma sala de espera (a sala de espera, o lugar onde sempre estamos entre uma experiência efetiva e outra), revela-se, então, um lugar de ação, de percepção participativa e conscientizadora.
*
Sala de Espera, portanto, traz de volta a este espaço um novo pulsar e, dessa maneira, recupera o melhor (de) Niemeyer.
Inaugurar este novo espaço de arte em São Paulo com uma intervenção que demonstra o quanto a arte atual, quando pode e sabe, consegue potencializar o passado, deve ser entendida como a manutenção do compromisso do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, com um lugar em que reflexão e prospecção devem caminhar juntas.
Um espaço arquitetônico ao mesmo tempo forte e sutil, banhado pela luz deslumbrante a ser destinado à arte contemporânea. (E foi nesse momento que me ocorreu convidar Carlito Carvalhosa a ocupá-lo. À época – maio de 2010 –, a produção do artista como que pedia um espaço monumental para se expandir como merecido). Porém, aquela feliz experiência com a obra do arquiteto foi logo interrompida pela informação de que o local mudaria bastante: um sistema de ar condicionado e paredes de drywall já haviam sido adquiridos para aquele espaço e seriam instalados de imediato.
Frente ao irreversível, adivinhei no que se transformaria aquele local, em que arquitetura e luz então se equilibravam com maestria: um imenso “cubo branco” , um portentoso templo de arte, apartado da natureza e da história.
Dito e feito: como todo espaço tradicional de arte moderna, por meio da adaptação pensada para uma arte confinada às suas especificidades preditas, a nova configuração do Anexo Original da nova sede do MAC USP acabou por transformar o edifício tão singular em mais um espaço para a arte tradicional. Ainda um belo espaço – não restam dúvidas – mas fechado em si mesmo, alheio às conexões que seu inventor havia concebido.
Felizmente, porém, Carvalhosa manteve o aceite do convite para a primeira intervenção artística no espaço, mesmo depois da reforma concluída. Felizmente porque o artista, com Sala de Espera, resgata o edifício do destino que, na última reforma, lhe fora traçado: transformá-lo no maior cubo branco brasileiro.
A estratégia de Carlito Carvalhosa para ativar o espaço que lhe foi oferecido, consistiu em tomar como ponto de partida, justamente, o caráter atemporal, “entre parêntesis”, que o Anexo Original assumiu após a última reforma. Para tanto, atacou o principal elemento estrutural da edificação: o conjunto harmonioso de pilotis. A essa quase etérea colunata, que parece emanar como sutil relevo do espaço todo branco, Carvalhosa opôs quase uma centena de antigos postes de madeira, que um dia serviram à rede elétrica.
Vista a intervenção do alto (a partir do mezanino), ou mesmo ao experimentá-la já em seu interior, o visitante perceberá que o artista confere àquele espaço – antes quase sagrado –, uma dimensão irreversível de atualidade. É justamente no jogo entre a série de pilotis e os postes nunca na vertical (todos se posicionam entre o horizontal e o oblíquo), aliado à densidade matérica, à espessura histórica dos postes, que a intervenção de Carvalhosa evidencia sua razão de ser.
O espaço que havia se tornado recluso, fechado em si mesmo, quase uma sala de espera (a sala de espera, o lugar onde sempre estamos entre uma experiência efetiva e outra), revela-se, então, um lugar de ação, de percepção participativa e conscientizadora.
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Sala de Espera, portanto, traz de volta a este espaço um novo pulsar e, dessa maneira, recupera o melhor (de) Niemeyer.
Inaugurar este novo espaço de arte em São Paulo com uma intervenção que demonstra o quanto a arte atual, quando pode e sabe, consegue potencializar o passado, deve ser entendida como a manutenção do compromisso do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, com um lugar em que reflexão e prospecção devem caminhar juntas.