Carlito Carvalhosa (1961-2021) viveu grande parte de sua vida no Rio de Janeiro, onde pode abraçar o legado radical dos artistas brasileiros que
o precederam. Carvalhosa soube trazer essas conquistas a um novo patamar, sem precedentes conceituais, formais e de escala.
A teoria do não-objeto neoconcreta, as bases fundamentais para uma definição do ‘parangolé’ de Oiticica, a fantasmática do corpo de Clark,
e o corpobra de Antonio Manuel tornaram-se marcos da inovação do fenômeno estético, conduzindo à experiências de esgotamento histórico e formal da arte, com implicações que antecipam manifestações atuais estabelecidas pela Estética Relacional e a Arte Performativa Pós- subjetiva. A radicalidade de algumas dessas
proposições adquiriu enorme peso para as gerações seguintes, traduzindo-se muitas vezes como a única conclusão possível para a prática artística. Como exemplo, podemos tomar as obras tardias de Hélio Oiticica ou Lygia Clark que em seu caráter efêmero e antimonumental, claramente fundaram territórios que transcendem as molduras convencionais da arte, em direção ao campo ampliado do além-arte: da terapia ou da prática social, do quasi-cinema e da anti- arte.
A totalidade do repertório constituído pela obra de Carlito Carvalhosa responde a este desafio histórico, desde a sua iniciação como pintor imerso nas profundezas dos recursos informais, até suas impressionantes instalações com tecido, néon, madeira, cera, espelhos e som. Entre as inúmeras
possibilidades ofertadas por esses materiais, Carvalhosa abordou a qualidade escultórica de drapeados e vincos, a pintura como volume
e massa, e mesmo a presença do som como elemento de densidade e opacidade em instalações icônicas. A obra de Carvalhosa destaca-se pela consistente compreensão que nos oferece da dimensão criadora da matéria e da materialidade nas artes visuais. Para o artista, matéria é imagem e as imagens sempre emergem do campo da materialidade como forças que se expandem através da opacidade e da transparência, da refletividade e da cegueira, como marcas na densidade do real que é preciso vivenciar, vez ou outra, como coisas que já existiam antes de nós.
—Luis Pérez-Oramas
by arteninja